NÃO HÁ COMO ADIAR O AMOR
Qualquer um tem direito a realizar um sonho antigo, reviver uma profissão interrompida, retomar um curso trancado.
Já as dívidas amorosas são irrecuperáveis.
Quem adia o amor não terá mais como quitar a inadimplência. É virtude prescrita.
Conta com a chance de ser melhor, mas precisará aceitar a herança perdida no passado.
Vejo pais que voltam aos filhos, arrependidos, depois de longa ausência, vejo maridos que insistem com a reconciliação após férrea alienação. Pedem uma segunda chance. Não existe segunda chance. O que existe é uma outra chance, a partir daquele momento em diante.
Se você não foi um pai presente, não há como ressarcir o roteiro da criança crescendo: os primeiros passos, as primeiras palavras, as primeiras descobertas. Esses preciosos capítulos foram escritos na areia e apagados pelo vento. Fotos e vídeos não suprem a verdade imprevisível das emoções.
Se você foi um marido ausente, não há como resgatar a delicadeza e a gentileza das cenas e das juras, da atenção constante não correspondida, das surpresas fracassadas, das datas festivas esquecidas. O romance passa rápido, e resta agora os créditos de um filme sem a sua participação.
Talvez até venha a ser perdoado pela convivência falhada, só que não haverá memória para a saudade, será mais saudade inventada do que lembranças em comum. Ficará um vácuo entre o que realmente se sabe do outro e o que se deveria saber.
O perdão não traz ninguém de volta. Perdão não é fingir que nada de grave aconteceu, um atenuante a mágoas e frustrações, um eufemismo de que é natural errar. Perdão é assumir os próprios defeitos e tentar fazer diferente. Perdão é futuro.
Eu me incomodo quando alguém diz que vai recuperar o tempo perdido de um relacionamento. É uma mentira educada. Sejamos honestos: o tempo jamais volta.
Ou você estava presente ou não pode falar a respeito. Amor é testemunho.
(Fabrício Carpinejar)