Macholândia
Brutus é um cabra macho. Daqueles que resolve tudo na força. Com linguajar grosseiro e vulgar, Brutus é o tipo de macho que acredita que ser educado é coisa de viado. As evidências estão na relação dentro da própria família. A forma carinhosa de Brutus tratar a mulher é na pancada, no desrespeito, desferindo palavrões e dizendo que, se não fosse por ele, a esposa seria ninguém na vida.
Brutus é um cara sábio. Ele sabe, no fundo, que tem alguma coisa errada nisso tudo e, por isso mesmo, não mede esforços para ficar controlando e vigiando a vida da esposa. Conflitante para quem tem a posse da “mulher objeto” e da mulher que depende tanto de um macho para ser alguém na vida, né Brutus?
O medo de Brutus, talvez, seja de a esposa, um dia, respirar a liberdade de ser o que ela quiser. Melhor Brutus continuar sufocando-a mesmo. A liberdade apavora quem nasceu para viver aprisionado.
Brutus é um cara tão sábio, tão sábio, que ele sabe que para compensar sua insegurança, ele também precisa dar mais evidências para sociedade de sua masculinidade dominante. Por isso anda pelas ruas cuspindo no chão, coçando o saco para todos notarem que ele tem alguma coisa pendurada no meio das pernas e mexendo com todas as mulheres que passam na rua.
Certa vez, Brutus meteu o soco na cara de um caboclo que mexeu com sua mulher. Para Brutus a regra é clara. “Eu mexo com quem eu quiser, mas nenhum macho frouxo mexe com minha mulher”. A sábia lógica de vida de Brutus é simples. Brutus entende que, quando ele mexe com a mulher dos outros, ele é macho. Quando os outros mexem com a mulher dele, são todos uns frouxos. Brutus é o símbolo máximo da Macholândia, a terra dos machos.
Brutus adora uma festa. Oportunidade excelente para deixar a esposa e os filhos em casa e sair nas ruas com seus amigos machos, exercitando o máximo da masculinidade. O sistema de Brutus é bruto. Macho que é macho manda na esposa. Manda, inclusive, a esposa ficar em casa enquanto ele vai para festa. Se não obedecer, porrada nela!
E assim Brutus calça o tamanco do super macho e começa, entre uma bebida e outra, a mexer com a mulherada da festa. Puxa o cabelo de uma. Passa a mão na bunda da outra. Cerca uma fêmea e informa que a passagem somente será liberada com um beijo. Apaixonado, Brutus começa recitar poesias para as damas passantes. O poeta das poesias vulgares. Para Brutus, o melhor adjetivo para uma dama é quenga. Brutus é um poeta.
A festa vai rolando e, com um pouco mais de bebida, Brutus fica ainda mais macho, mas ganha um olhar tênue. De olhar em olhar, os machos da turma começam a se entreolhar.
Brutus fica sensível. Envolve um amigo macho num longo abraço. Dá um cheiro no cangote do outro amigo macho. Belisca o mamilo do macho que acabou de chegar na roda e, festeiro que só ele, dá uma reboladinha no macho que acabou de agarrá-lo pelas costas, dançando a música que vai até o chão.
De repente, Brutus se lembra que é macho, que é bruto, então se afasta e diz para os outros machos que ele não é baitola não. Todos os amigos machos caem na risada. A festa continua e Brutus continua abraçando de forma calorosa a machaiada. Beija um macho no rosto. Roça a barba na barba do outro macho. Tudo coisa de macho. Que festa boa! Brutus está realizado.
A Macholândia é assim, uma terra cheia de machos. A única coisa que não se encontra na Macholândia é homem. Para ser homem não depende de gênero, depende de caráter e respeito. Depende, sobretudo, de ter atitude de homem e não de um moleque. Brutus não é homem. Brutus é apenas um macho. Um infeliz baitola macho.
No final da festa da libertação de Brutus, ele volta feliz e bêbado para casa, para bater na esposa e lembrá-la quem é o macho da família.
(Edmar Scarabello)