As mulheres são capazes de violência? Sim, inclusive (sobretudo) as mais doces e amorosas. A violência circunstancial não tem nada a ver com o sexo de quem a inflige. Quando exaltadas, no âmago de uma tormenta amorosa, algumas pessoas podem atirar cinzeiros na cabeça do "traidor", esbofetear ou até quebrar um braço. Mesmo falando informalmente com nossos amigos e parentes poderemos constatar, surpresos, que quase todos vivenciaram pelo menos uma ou duas cenas de violência física, especialmente mos momentos de ruptura. De que somos capazes em situações extremas? Felizes os que se sentem protegidos contra o pior. Podem ser aqueles que jamais tenham se apaixonado perdidamente ou nunca tenham sido enganados passionalmente. Você e eu podemos ser autores de violência em situações excepcionais. Por outro lado, as personalidades violentas são vulcões cuja cólera, sempre em atividade, murmura permanentemente de maneira quase inaudível. Além disso, as explosões, quando ocorrem, revelam mais um processo interno do que externo. Não são as pessoas ou as situações que fazem a lava jorrar, e sim uma força interior, independente das circunstâncias e mesmo da própria vontade. Essa violência constitutiva da personalidade se exprime até pelos poros. A violência física está diretamente relacionada à violência psicológica. A violência psicológica precede, prepara, acompanha, sucede a violência física. Da ofensa ao gesto, passam-se segundos. Bater não é a única maneira de aterrorizar. Ironias, exigências, ciúme e silêncios contribuem para criar uma tensão insuportável. As pessoas ao redor ficam com os nervos à flor da pele. Elas semtem que, à sombra, a violência espreita, pronta para atacar e tudo destruir em sua passagem. É por isso que não zombamos nem provocamos uma personalidade violenta, pois sabemos que ela existe e nos submetemos a ela. As personalidades violentas ocorrem em todas as classes sociais e 10% das mulheres espancadas têm nível superior. Em geral, os homens agridem. As mulheres se autodestroem. A agressividade numa relação leva tempo para se tornar física. No início, é psicológica e sutil, uma exigência aqui, uma observação ali, tudo sobre um fundo de amor e ternura. Sofremos da síndrome da mulher perfeita, abrindo as portas a todas as críticas que nos são feitas. Tentamos nos tornar irrepreensíveis e, ao fazer isso, abrimos o flanco às críticas. Em resumo, as personalidades violentas se valem da nossa própria insegurança. São as armas que nós mesmas oferecemos ao nos tornar "ninguém" que os homens brandem para nos rebaixar e ter a ilusão de superioridade. Aos olhos deles, e aos nossos, já não estamos bem: somos inadequadas. As mulheres agredidas querem acreditar que existe uma "boa maneira" de lidar com um homem violento. Secretamente, se acham responsáveis pela violência ao não dizer ou fazer o que deveria ter sido, dito ou feito. Mas mesmo se elas fossem culpadas por alguma coisa, isso justificaria um ombro deslocado, uma queimadura de cigarro na coxa? Não existe parceiro sob medida para as personalidades violentas. Elas são motivadas por pulsões irrepreensíveis que os força a gritar ou agredir sem necessidade de situação ou pretexto. Os homens violentos mais perigosos são os reincidentes. Eles alternam brutalidade e arrependimento e possuem dois rostos, um social outro aterrorizador e reservado à vida privada. Esses homens necessitam controlar, rebaixar, humilhar, para se sentirem sempre dono da situação. Existem técnicas terapêuticas que podem ajudar esses homens a observar os ciclos de violência e reconhecer os sinais que a precedem para tentar controlá-la. Mas apenas uma terapia de longa duração, capaz de reformular completamente uma personalidade violenta, pode provocar mudanças profundas e reduzir as tensões psíquicas que dão origem às agressões. Ninguém é capaz de mudar esses homens, muito menos sua mulher, pois está envolvida demais nessa relação. Os tiranos domésticos acreditam que seu papel como chefe de família consiste em manter a ordem de modo autoritário e vigiar a vida da família. São homens meticulosos, perfeccionistas, dominadores e controladores, que consideram a mulher sua propriedade. Primeiro eles a dominam e depois a isolam de sua rede social.
do livro: Amores que nos fazem mal - Patricia Delahaie - Pág 108