SEU FILHO VALE MENOS QUE UM RATO?
Qualquer ser humano normal considera que a vida de seu próprio filho vale mais do que a vida de um rato. Mas é verdade também que qualquer ser humano normal considerará a vida de seu filho mais valiosa do que a vida de uma outra criança. Isso porque conferimos mais valor àquilo de que gostamos mais. Essa questão de preferência, porém, não se reflete no valor real dos indivíduos.
Nenhum ser humano normal mata uma outra criança porque seu próprio filho está precisando dos órgãos. Ninguém atualmente tenta justificar racionalmente a utilização de crianças africanas para testar medicamentos que serão comercializados nos Estados Unidos com base em argumento do tipo “Seu filho vale menos que uma criança africana?”.
Para mim meu filho vale mais do que o filho do meu vizinho, mas isso não me dá direito algum sobre o filho do vizinho. Então por que esse argumento vil, malicioso e injusto é utilizado para tentar justificar o uso de animais em laboratórios? A única resposta que me ocorre é a de que existem poucos argumentos plausíveis a favor da experimentação animal. É necessário, de fato, apelar-se para esses, correndo-se o risco de simplesmente não se conseguir justificá-la. Trata-se de uma estratégia manipulatória de desespero e mesmo cientistas de renome não temem usá-la.
Existem ainda outras linhas de defesa baixas da experimentação animal. Uma delas diz que sem a pesquisa em animais a ciência ficará estagnada. Isso é condicionar todo o pensamento científico a uma única metodologia. Caso isso fosse verdadeiro, se isso de fato assim o fosse, não seriam necessários cientistas nos centros de pesquisa, bastariam técnicos capazes de seguir protocolos experimentais. Isso seria também negar todas as descobertas científicas realizadas sem animais, baseadas na observação de fenômenos em situações de campo, ou seja, praticamente todas.
Outra linha trata de colocar os ativistas pelos direitos animais como fundamentalistas irracionais, terroristas, culpados por todo o atraso da ciência. Essa tentativa de retratar ativistas como criaturas obscuras e medievais, de desumanizá-los ou compará-los a nazistas nada mais é do que uma estratégia de desespero.
Quando acusações reais não são possíveis, apela-se ao irreal. E cientistas mandam para si mesmos cartas ameaçadoras e se colocam como mártires pela ciência, e apesar de tudo continuarão com seu importante trabalho, pelo bem da humanidade. Mas se há algo de medieval e nazista em toda essa história isso ocorre quando se acendem fogueiras para queimar um inimigo que não existe, ou quando se utilizam argumentos de cunho supremacista para justificar o injustificável, como a pergunta que dá título a esse artigo.
Mesmo que cientistas sejam, eventualmente, ameaçados por um ou outro ativista, essas ameaças refletem a única manifestação contrária ao que eles praticam diariamente contra criaturas tão sencientes quanto seus próprios filhos. As ameaças são atitudes de desespero de pessoas que sabem que não podem apelar para as leis nem a nenhuma força legal. Esses cientistas são culpados, não são vítimas como querem se colocar. Ainda assim, ameaças, mesmo quando existem, quase nunca são levadas a cabo.
Nossa cultura nos faz conferir valores diferente para vidas animais e humanas. Mas ela também nos faz conferir valores diferentes para as pessoas que conhecemos e as que não conhecemos, para povos com os quais temos boas relações e para aqueles aos quais somos indiferentes, para animais com os quais simpatizamos e para aqueles com que não simpatizamos. Essas questões de preferência pessoal nada têm a ver com o valor real da vida. Quando cientistas de renome fazem uso dessa psicologia para tentar justificar seus crimes, quando esses argumentos são os melhores que existem para defender a experimentação animal, fica evidenciado que a vivissecção é uma instituição em ruínas.
Fonte: ANDA - Agência de Notícias de Direitos Animais
Sérgio Greif - sergio_greif@yahoo.com
Biólogo formado pela UNICAMP, mestre em Alimentos e Nutrição com tese em nutrição vegetariana pela mesma universidade, docente da MBA em Gestão Ambiental da Universidade de São Caetano do Sul, ativista pelos direitos animais, vegano desde 1998, consultor em diversas ações civis publicas e audiências públicas em defesa dos direitos animais. Co-autor do livro "A Verdadeira Face da Experimentação Animal: A sua saúde em perigo" e autor de "Alternativas ao Uso de Animais Vivos na Educação: pela ciência responsável", além de diversos artigos e ensaios referentes à nutrição vegetariana, ao modo de vida vegano, aos direitos ambientais, à bioética, à experimentação animal, aos métodos substitutivos ao uso de animais na pesquisa e na educação e aos impactos da pecuária ao meio ambiente, entre outros temas. Realiza palestras nesse mesmo tema. Membro fundador da Sociedade Vegana.