CHEGUE NA PAZ

2 de nov. de 2012

Os alicerces da paz interior

Minha mensagem é a prática do amor, da compaixão e da bondade. Estas qualidades são muito úteis para vivermos nosso cotidiano mais harmoniosamente, e também muito importantes para a sociedade humana como um todo.

Uma profunda compaixão é a raiz de todas as formas de adoração.

Aonde quer que eu vá, sempre aconselho as pessoas a serem altruístas e bondosas. Tento concentrar toda a minha energia e força espiritual na disseminação da bondade. É o que há de mais essencial.

A bondade é o que realmente importa. A bondade, o amor e a compaixão combinados são sentimentos que levam à essência da fraternidade. São os alicerces da paz interior.

Com sentimentos de ódio e rancor, é muito difícil alcançar a paz interior. Neste sentido, as religiões e crenças são convergentes. Em todas as grandes religiões do mundo, a ênfase é no espírito de fraternidade.

São os inimigos que verdadeiramente nos ensinam a vivenciar sentimentos de compaixão e tolerância. As guerras surgem porque não há compreensão do lado humano das pessoas. Ao invés de conferências e encontros políticos, por que não convocar as famílias a fazerem um piquenique para que se conheçam mutuamente, enquanto suas crianças brincam juntas?

Nos tempos antigos, quando havia uma guerra, o embate era corpo a corpo. O vitorioso entrava em contato direto com o sangue e o sofrimento do inimigo durante a batalha. Hoje, as guerras adquiriram uma proporção muito mais horrenda. Um homem, sentado em uma sala, aperta um botão e mata milhões de pessoas instantaneamente, sem ao menos ver o sofrimento humano que infligiu. A mecanização da guerra e a automação do conflitos humanos são, cada vez mais, uma ameaça à paz mundial.

Sempre acreditei que a determinação humana e a verdade prevaleceriam sobre a violência e a opressão. No mundo de hoje, em todos os lugares, há mudanças importantes ocorrendo, que poderão afetar profundamente nosso futuro e o futuro da humanidade, bem como nosso planeta. Decisões corajosas por parte de vários líderes mundiais propiciam a resolução pacífica de conflitos. A esperança de haver paz, preservação do meio ambiente e uma abordagem mais humana aos problemas do mundo parece estar mais presente que nunca.

Ninguém pode prever o que acontecerá em algumas décadas ou séculos, por exemplo, qual o impacto que o desflorestamento terá sobre o clima, o solo, as chuvas. Temos muitos problemas porque as pessoas estão centradas em seus próprios interesses, em ganhar dinheiro e não estão pensando no bem-estar da comunidade como um todo. Não estão pensando na Terra a longo prazo, e nos efeitos ambientais adversos sobre o homem. Se nós, da atual geração, não refletirmos sobre estas questões agora, as gerações futuras não terão como lidar com elas.

Muitos de nós juntam-se sob o mesmo sol resplandecente, falando línguas diversas, vestindo indumentárias diferentes e até mesmo possuindo crenças distintas. Contudo, nós todos somos idênticos como seres humanos e individualmente únicos. Desejamos todos, indistintamente, a felicidade e não o sofrimento.

Mesmo que não possamos resolver certos problemas, não devemos nos frustrar. Como humanos devemos enfrentar a morte, a velhice e doenças, que, tal qual um furacão, são fenômenos naturais que fogem ao nosso controle. Devemos enfrentá-los, não podemos evitá-los. São sofrimentos que já bastam em nossa vida. Por que criarmos mais problemas por apego à nossa ideologia ou porque pensamos de maneira diferente? É inútil e triste! Milhões de pessoas sofrem com esse tipo de problema. É um verdadeiro desperdício, visto que podemos evitar o sofrimento adotando uma atitude diferente e reconhecendo a humanidade à qual as ideologias deveriam servir.

Rancor, ódio, ciúme: não é possível encontrar a paz com eles. Podemos resolver muitos de nossos problemas por meio da compaixão e do amor. Só assim nos desarmaremos e encontraremos a verdadeira felicidade. Uma das maiores virtudes é a compaixão. A compaixão não pode ser comprada numa loja de departamentos ou fabricada por máquinas. Ela advém do crescimento interior. Sem paz de espírito, é impossível haver paz no mundo.

Na nossa vida, cultivar a tolerância é muito importante. Com tolerância, pode-se facilmente superar as dificuldades. Caso você tenha pouca ou nenhuma tolerância, ficará irritado com as mínimas coisas. Em situações difíceis, terá reações extremadas. Em minha vida, já refleti muito a respeito desta questão e sinto que a tolerância é algo que deve ser praticado no mundo inteiro, no seio da sociedade humana. Mas, quem nos ensina tolerância? Pode ser que seus filhos o ensinem a cultivar a paciência, mas é seu inimigo quem irá ensinar-lhe a prática da tolerância. O inimigo é seu mestre. Mostre-lhe respeito, ao invés de ódio. Dessa forma, a verdadeira compaixão irá brotar de seu interior e essa compaixão é a base de tudo aquilo que você é e acredita.

Bens e compensações materiais são absolutamente necessários à sociedade humana, a um país, a uma nação. Ao mesmo tempo, o progresso material e a prosperidade somente não podem levar à paz interior. A paz interior vem de dentro. Portanto, nossa atitude perante a vida, perante os outros e principalmente em relação às nossas dificuldades conta muito. Quando duas pessoas enfrentam o mesmo problema, atitudes mentais distintas fazem com que o problema seja de mais fácil resolução para uma pessoa do que para outra. Desta forma, o que realmente nos diferencia é a perspectiva interna de cada um.

Se colocarmos os níveis de consciência mais sutis a nosso serviço, estaremos expandindo nossa mente. Assim sendo, as virtudes originárias da mente podem se expandir ilimitadamente.

A compaixão e o amor são as virtudes mais preciosas da vida. Por serem muito simples, são difíceis de serem colocados em prática. A compaixão só poderá ser plenamente cultivada à medida que se reconhece que cada ser humano é parte da humanidade e pertencente à família humana, independente de religião, raça, cultura, cor e ideologia. A verdade é que não há diferença alguma entre os seres humanos.

Sem amor, a sociedade humana encontra-se em situação difícil. Sem amor, iremos enfrentar problemas terríveis no futuro. O amor é o centro da vida.

Se tiver amor e compaixão por todos os seres sencientes, em especial por seus inimigos, este é o verdadeiro amor e a verdadeira compaixão. O amor e compaixão, nutridos por seus amigos, esposa e filhos, não são verdadeiros em sua essência. São apego, e esse tipo de amor não pode ser infinito.

Insisto em afirmar que as principais religiões do mundo — budismo, cristianismo, judaísmo, confucionismo, hinduísmo, islamismo, jainismo, sikhismo, taoísmo, zoroastrismo — possuem os mesmos ideais de amor, o mesmo objetivo de beneficiar a humanidade por meio da prática espiritual, e a mesma determinação de aprimorar seus praticantes como seres humanos. Todas as religiões pregam preceitos morais para o aperfeiçoamento da mente, do corpo e da fala. Todas nos ensinam a não mentir, roubar ou tirar a vida de outras pessoas. A essência de todos os preceitos morais preconizados pelos grandes mestres da humanidade é o não-egoísmo. Esses mestres tinham como objetivo remir os praticantes de ações negativas, frutos da ignorância, e conduzi-los ao caminho do bem.

Se percebemos a humanidade como sendo una e singular, iremos constatar que as diferenças são secundárias. Com atitude de respeito e preocupação pelo próximo, experimentamos a felicidade. Só assim criamos a verdadeira harmonia e fraternidade. À sua maneira, tente cultivar a paciência. Modifique sua atitude. As mudanças vêm com a prática. A mente humana tem esse potencial. Aprenda a treiná-la.

A nossa sombra interior, a que chamamos de ignorância, é a raiz de todo o sofrimento. Quanto mais luz houver, menos a sombra se manifestará. A luz é o único caminho para a salvação, para alcançar o nirvana.

Deve haver um equilíbrio entre o progresso espiritual e o material. Atinge-se esse equilíbrio por meio de princípios calcados no amor e na compaixão. O amor e a compaixão são a essência de todas as religiões, que têm muito a aprender entre si. O objetivo primordial de todas as religiões é criar seres humanos mais tolerantes, mais compassivos e menos egoístas.

Os seres humanos são dotados de uma natureza tal que não deveriam apenas possuir bens materiais, mas deveriam antes possuir sustento espiritual. Sem o sustento espiritual, torna-se difícil adquirir e manter a paz de espírito.

Para cultivar a sabedoria, é preciso força interior. Sem crescimento interno, é difícil conquistar a autoconfiança e a coragem necessárias. Sem elas, nossa vida se complica. O impossível torna-se possível com a força de vontade.

(Dalai Lama)